Diversidade racial na publicidade vive estagnação, indica pesquisa – Agência Brasil
Ex.Saúde, Presidente, Governo A representatividade de mulheres negras como protagonistas em comerciais de TV vive um momento de estagnação,
Ex.Saúde, Presidente, Governo
A representatividade de mulheres negras como protagonistas em comerciais de TV vive um momento de estagnação, enquanto o cenário para os homens negros já indica retrocessos. A conclusão é de uma pesquisa da agência Heads Propaganda e da ONU Mulheres que aponta ainda mais ausência de representatividade de pessoas negras quando analisados anúncios que envolvem idosos ou veiculados em programas infantis.
Para tal, foram observados comerciais nos canais de maior audiência na TV aberta e fechada, além de um canal com programação infantil, veiculados entre 15 e 21 de fevereiro. Além disso, o estudo levou em consideração publicações no Facebook das mesmas 133 marcas contabilizadas no levantamento das propagandas televisivas.
Com base em 3.133 propagandas de TV, o estudo concluiu que, quando os homens são protagonistas, eles são brancos em 84% dos casos, e negros em 7%. Em outros 9% dos comerciais, esses homens são de várias etnias. No caso das mulheres, as brancas ocuparam 74% dos papéis principais, enquanto as negras, 22%, e as mulheres de várias etnias, 4%.
Realizada desde julho de 2015, a pesquisa aponta que a representação de mulheres negras como protagonistas cresceu até julho de 2017, mas se estagnou desde então. Em julho de 2018, o percentual chegou a atingir 25%, mas caiu para 17% em fevereiro de 2019 e voltou a subir para 22% em fevereiro de 2020.
Já a representação de homens negros como protagonistas teve um pico de 22% em fevereiro de 2019, mas voltou a cair para 7% este ano, retrocedendo ao mesmo patamar de julho de 2017. A pesquisa destaca que quando o personagem masculino é coadjuvante, a participação dos homens negros salta para 41%, enquanto a das mulheres negras cai para 4%.
Pesquisadora e publicitária da Heads Propaganda, Isabel Aquino destaca que o ideal é que a representatividade da população negra na publicidade seja equivalente à composição social da sociedade brasileira. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mais da metade dos brasileiros se identificam como pretos ou pardos, grupos que formam a população negra nos critérios do instituto.
“A gente tem uma população de 55% de pessoas negras, e só um quarto da publicidade tem protagonistas negros. Há algo errado aí. A gente evoluiu, mas chegou em um cenário de estagnação”, avalia a publicitária, que destaca a importância da diversidade de profissionais nas agências e nas empresas que encomendam as campanhas para que essas histórias sejam contadas com mais frequência.
“Nós somos reprodutores de cultura, e a gente bebe muito nas nossas próprias experiências. Se eu tenho [uma equipe de] criação que é homogênea em termos de repertório, isso vai reproduzir o mesmo tipo de mensagem. Do ponto de vista da agência, dou esse destaque para as equipes de criação, mas dentro das empresas também. As empresas ainda estão acreditando muito em um conceito de meritocracia que acaba construindo uma fábrica de pessoas do mesmo tipo, que vem dos mesmos lugares e com os mesmos tipos de experiência”, disse Isabel.
Comerciais que mostram homens e mulheres como protagonistas retrataram várias etnias em 92% dos casos. O estudo aponta que o predomínio da diversidade nas propagandas com mais protagonistas é um indicador de que pessoas negras não têm ocupado com frequência o papel de consumidor universal.
“A gente não quer dizer que esse tipo de representação seja ruim. Que bom que existe e que esses dados cresceram e que as pessoas acreditam que vale a pena colocar a diversidade em um contexto de várias pessoas. Mas quando a gente só representa o negro dessa forma, a gente está dando invisibilidade e perdendo a oportunidade de criar situações em que a gente consiga aprofundar a personalidade dessa pessoa, mostrar a profissão dela como uma profissão bacana, diferente e empoderada, diferente do estereótipo que a gente está acostumado a ver”, analisa a pesquisadora.
Nos 658 anúncios das mesmas marcas no Facebook que foram analisados, a presença dos negros é maior que na televisão. O percentual de homens negros protagonistas sobe de 7% para 23%, enquanto o de mulheres negras, de 22% para 35%.
A pesquisa avaliou pela segunda vez a veiculação de propagandas em um canal infantil da TV paga e constatou que mulheres e meninas são protagonistas em 54% dos anúncios. Entre essas personagens, 88% são brancas e 12%, negras. Os homens e meninos têm o papel principal em 13% dos anúncios, sendo 89% brancos e 9% negros.
“Parece que a discussão sobre a representatividade está nos adultos, e a gente não para para pensar nas crianças, mas é nesse momento que está se formando consciência, mentalidade, visão de mundo. E a gente está criando um super problema que teremos que resolver no futuro por crianças não verem pessoas negras, crianças negras, personagens negros naquelas situações. Esse é um dado muito grave que a gente precisa sinalizar para a indústria”.
A análise aponta que a quantidade de comerciais que empoderam é praticamente a mesma de comerciais que estereotipam, e as principais formas de estereotipação das mulheres e meninas nas propagandas no canal infantil foram a idiotização, a representação delas competindo umas contra as outras e exercendo papel de mãe ou cuidando da família. Para os homens e meninos, a estereotipação foi no sentido de retratá-los como especialistas, autoritários ou em posições de poder. Para a pesquisa, as meninas receberam mais estímulos de padrão de beleza, e os meninos, para estudarem e pensarem no futuro.
A pesquisa também faz uma análise das representações que estereotipam ou empoderam os gêneros na publicidade de modo geral. Exemplos de empoderamento são propagandas que valorizam a união, a liberdade de escolha e o talento de mulheres, em vez de sua aparência física ou acúmulo de tarefas domésticas e familiares.
O estudo considerou que 34% das propagandas analisadas empoderam o gênero retratado, enquanto 15% estereotipam e 8% fazem as duas coisas. Em 43% das propagandas, não há representação de gênero ou ela não é empoderada nem estereotipada.
Entre os estereótipos mais frequentes no caso da mulher estão o papel de mãe, a mulher cuidadosa com a família, a mulher objetificada e a super mulher, com acúmulo de papéis. Já o homem é estereotipado como especialista ou em posições de poder.
Um dos recortes do estudo avaliou a presença de pessoas com mais de 60 anos nos comerciais e concluiu que apenas 12% da amostra coletada retratava esse grupo etário nas narrativas veiculadas.
Nas propagandas na TV, as mulheres negras com mais de 60 anos não foram retratadas em nenhum dos anúncios analisados, enquanto os homens negros foram 42% dos personagens com mais de 60 anos.
Edição: Aécio Amado
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