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Como a publicidade incentiva “fake news” – CartaCapital

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Como a publicidade incentiva “fake news” – CartaCapital

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Sistema de anúncios online contribui para que popularidade de matérias seja mais importante do que a veracidade delas
Por Benjamin Bathke
Graças à receita de publicidade, o incentivo financeiro para a criação e difusão de notícias falsas ainda é alto – apesar da ação maciça do Google para que a indústria de publicidade digital tente conter a avalanche de notícias falsas.
Um estudo conduzido pelo portal de notícias BuzzFeed chegou à conclusão de que, no início de abril, mais de 60 sites que publicam informações falsas ganharam dinheiro com o serviço de publicidade Google AdSense e outras importantes redes de anúncios. Disseminadores de boatos expulsos de certas redes de anúncios muitas vezes, além disso, simplesmente se mudam para outras redes.
Mas por que isso é assim? De acordo com um estudo realizado pela London School of Economics (LSE), uma forma relativamente nova de publicidade online é o combustível que mantém a máquina de notícias falsas funcionando financeiramente – ou que até mesmo a coloca em funcionamento.
O professor da LSE e autor do estudo, Damian Tambini, diz que um novo modelo, chamado de publicidade programática, não “recompensa” notícias cuja veracidade foi confirmada e sim aquelas que são visualmente atraentes e têm boa chance para serem compartilhadas em redes sociais.
“A nova estratégia de publicidade digital cria um vínculo econômico muito mais direto entre a ressonância e a capacidade de compartilhamento de artigos individuais e o lucro econômico”, escreve Tambini no estudo. “Além disso, o modelo permite a publicações menores se estabelecerem fora das exigências éticas e de autorregulação.” Com “publicações menores”, Tambini se refere especialmente àquelas que divulgam notícias falsas e meias-verdades, como Huzlers, que dentro de curto espaço de tempo conseguiu um grande alcance e bolsos cheios.
Publicidade programática é comprada e colocada no ar usando algoritmos, de forma totalmente automática e em tempo real. É o tipo de publicidade que “persegue” o internauta muitas vezes por vários dias e através de muitos sites como, por exemplo, depois de ele ter consultado uma conexão de voo na internet.
Problema global
Neste tipo de publicidade, a decisão sobre a colocação no ar do anúncio não depende da publicação ou do site, mas na quantidade de cliques esperados ou da visualização de um público-alvo específico. Esta distinção é o ponto crucial, de acordo Tambini. “Contanto que o anúncio tenha uma boa cobertura, seu veiculador não tem nada contra ele. O número de visualizações é mais importante do que a notícia”, explica.
Publicidade programática
O cálculo por trás disso é simples: quanto mais a publicidade é vista, mais cliques são registrados. E mais cliques significa mais receita para o veículo de publicidade, nesse caso, o site onde a publicidade é veiculada. “Pelo fato de não só os sites, mas também anunciantes, agências e plataformas se beneficiarem do modelo, maximizar o número de visualizações passa a ser de interesse de todos”, ressalta Tambini. “Por isso, há poucos incentivos para uma mudança do modelo.”
Tambini vê no domínio da publicidade programática uma “mudança estrutural massiva, que vem alterando sistemas de mídia em todo o mundo”. O novo editor, então, pode operar em qualquer lugar do mundo – mesmo em países que têm interesse em usar notícias falsas para minar a segurança nacional de outros Estados ou deslegitimar sua democracia. A declaração do professor de mídia pode ser interpretada como uma alusão à tentativa da Rússia de influenciar o resultado das eleições nos Estados Unidos e na França.
A publicidade programática também leva publicações, na corrida pelos cliques e por maior receita publicitária, muitas vezes a publicarem conteúdo sem antes verificar sua veracidade. Isto fica claro, por exemplo, em um vídeo datado de fevereiro 2017 em que uma mulher destrói um veículo no meio da rua. As imagens foram divulgadas por várias publicações britânicas. O vídeo acabou sendo desmascarado posteriormente como uma encenação.
Farhad Manjoo, colunista do New York Times, compara o problema da indústria da publicidade com a falta de transparência das cadeias de produtos. “Muitas vezes não sabemos quem exatamente produz uma peça de roupa ou se a venda de um diamante ajuda a financiar uma guerra. A única coisa que ajuda é investigar”, diz Manjoo.
Primeiras correções
As falhas óbvias da publicidade programática foram expostas ultimamente através de vários casos de destaque: a decisão de anunciantes no final de 2017 de não colocar nenhum anúncio no site de notícias e opiniões de extrema direita americano Breitbart; o boicote contra o Youtube realizado por 250 empresas, incluindo Ford, Starbucks e Ikea, após seus comerciais terem sido divulgados no portal ao lado de vídeos de conteúdo, em parte, extremista; e o banimento promovido pelo Google de centenas de publicações de seu sistema de anúncios online AdSense.
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Tambini se refere a essas medidas como um possível sinal de uma autocorreção no sistema. No entanto, tal dinâmica de autorregulação provavelmente não será suficiente, já que as consequências da “profunda mudança estrutural” ainda não são previsíveis. “Por isso, talvez sejam necessárias intervenções e mais supervisão por parte dos políticos”, diz Tambini, alertando contra exageros. “Medidas precipitadas poderiam limitar a liberdade de expressão e minar a autonomia da mídia”, pondera.
Ele acredita que teria mais sentido a criação de um código de conduta e de selos de qualidade, que poderiam criar transparência, permitindo que anunciantes possam ter mais controle sobre o posicionamento de suas mensagens.
É exatamente isso que deseja a recém-lançada iniciativa Open Brand Safety (OBS). O projeto conjunto da startup de mídia irlandesa Storyful e da empresa americana de análise de publicidade Moat tem objetivo declarado de criar um banco de dados de domínios e de URLs de vídeos suspeitos, com o qual “marcas, agências e plataformas possam decidir melhor onde colocar seus anúncios”.
Mas a publicidade programática não tem apenas desvantagens. De acordo com Manjoo, um adolescente com uma grande comunidade de fãs no Youtube quase não conseguiria ganhar dinheiro sem o patrocínio da publicidade programática. “Além disso, o novo modelo cria um mercado de publicidade mais eficiente”, argumenta Manjoo. “E o atual debate vai acabar por levar a uma melhor publicidade e a melhores meios de comunicação”, prevê.
Seja com novas leis, iniciativas como a OBS ou autorregulação – ninguém sabe quando e como o modelo de publicidade programática dominante vai mudar. Mas uma coisa é certa: um retorno ao modelo antigo, em que espaços publicitários não eram vendidos por computadores, mas por pessoas, provavelmente não vai acontecer. Somente o Google teria que contratar, para isso, cerca de 100 mil novos funcionários.


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